quinta-feira, 18 de março de 2010

A Anima Mundi e a Cultrura

     Falar de indivíduo é também falar de cultura, pois, além de ser o "local" onde ele está inserido, é um "pedaço" necessário para que ocorra o processo de individuação. O homem se individualiza quando reconhece o que é dele e o que é do outro, mas ele não faz esse reconhecimento sozinho, também precisa desse outro como espelho dele mesmo e de diferenciação. Em um dos capítulos "A crise do homem moderno e a onipotência Prometeu" de seu livro "A Mitopoese da Psique", Walter Boechat fala do mundo natural que foi despsiquificado ou desencantado, pois era o mundo onde habitavam deuses, ninfas e todos os mensageiros celestiais. Esse mundo é o fator mitologizador da psique. Boechat faz referência ao trabalho de 1945 de Jung "Anotações sobre eventos contemporâneos" para explicar o movimento da consciência discriminativa:
     "Até alguns séculos atrás aquelas regiões do mundo, as quais desde então têm sido iluminadas pela ciência, estavam mergulhadas na mais profunda escuridão. A natureza estava então em seu estado original, como esteve desde tempos imemoriais. Apesar de há muito ser o habitat de deuses, ela não fora, de nenhuma maneira, despsificada. Espíritos ainda assombravam as terras e as águas e se ocultavam no ar e no fogo; a feitiçaria e profecias lançavam suas sombras sobre as relações humanas e os mistérios da fé exerciam profunda influência no mundo natural. Em certas flores podiam-se encontrar imagens dos instrumentos de torturas dos mártires e do sangue de Cristo; à espiral da esquerda para a direita na concha do caramujo era uma prova da existência de Deus.
     Hoje não podemos imaginar esse estado mental de forma alguma, não podemos sequer supor o que seja viver em um mundo que fosse preenchido com os mistérios das maravilhas de Deus, desde o mais religioso e sublime até o mais cotidiano da forja do ferreiro, e fosse corrompido a partir de baixo pelo engano demoníaco, marcado pelo pecado original e secretamente animado por um demônio autóctone ou por uma anima mundi - ou por essas 'centelhas da Alma do Mundo' as quais brotaram como as sementes da vida quando o Ruah Elohim pairou sobre a face das águas (JUNG, 1945).
     Boechat nos diz que o perigo da despsificação são, por exemplo, as guerras que vemos hoje em dia. Achando que havia abominado esse mundo natural, o homem acabou engolindo-o em si próprio. O que vemos hoje é o herói arrogante, em busca do exercício do poder sobre o outro quando beneficia uma minoria e exlcui a massa. O homem não percebe que as transformações positivas que podem ocorrer em momentos de crise não se dão através da destruição, e sim de uma dialética construtiva: interação e aprendizado. E essa dialética só acontecerá quando buscarmos as respostas na experiência de ser um indivíduo, ou seja, no Processo de Individuação.

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